No meio de tantas vozes e de tantos argumentos sobre o referendo ao aborto corremos o risco de perder de vista o essencial.
1. A noção de que, em cada gravidez, estão envolvidas, pelo menos, duas vidas. A da mãe e a do seu filho. Qualquer que seja o problema que a mulher experimenta, a melhor solução é aquela que salvaguarda a vida de ambos.
Uma escolha unilateral, que sacrifica o filho em favor da mãe, é injusta e insustentável. O verdadeiro desafio que deve mobilizar toda a sociedade e todo o Estado é o de oferecer soluções alternativas ao aborto. Numa sondagem, realizada em Portugal no passado mês de Dezembro, mais de 75% das mulheres inquiridas afirmavam que, em caso de dificuldade em prosseguir com a gravidez, preferiam ser ajudadas e apoiadas em vez de abortar. As soluções alternativas ao aborto existem, como se vê pelo trabalho realizado por tantas associações de apoio às grávidas, como a ADAV-Coimbra, com a qual tenho colaborado desde o início. As mulheres portuguesas não precisam de acesso livre ao aborto, precisam de ser ajudadas a superar os problemas concretos que enfrentam. Mais aborto é sinal de que nos demitimos de as ajudar.
2. O aborto a pedido é um presente envenenado. Promete o que não pode dar uma vez que o aborto não resolve qualquer problema. Basta um exemplo para percebermos imediatamente: uma mulher que aborta por ser pobre não fica depois menos pobre. O aborto não só não é a solução como é fonte de mais problemas para a mulher. O aborto, seja legal ou clandestino, prejudica a saúde física e psíquica da mulher. Eu vi o sofrimento das mulheres que abortaram e a alegria das que deram à luz. A maioria das mulheres que abortaram ignoravam as consequências que essa decisão acarretaria para as suas vidas. Elas não precisam de acesso fácil ao aborto livre. Precisam de acesso fácil a ajuda efectiva e a apoio concreto. Acresce que o aborto livre deixa a mulher grávida numa situação de maior vulnerabilidade a pressões de terceiros para abortar. Sabia que mais de 60% das mulheres que abortam o fazem contrariadas e pressionadas por terceiros?
3. O que está em causa não é despenalizar o aborto. Há 22 anos que, no nosso país, o aborto não é punível quando está em perigo a vida da mãe, quando a gravidez ocorreu devido a violação ou quando o feto tem malformações. Agora o que alguns pretendem, sob o pretexto - porque nenhuma foi presa - de não enviar as mulheres para a prisão, é liberalizar o aborto até às 10 semanas. O aborto tornar-se-ia um direito absoluto, exclusivo e irrestrito da mulher, pago com o dinheiro dos impostos e realizado em lucrativas clínicas de aborto. Mas então, mesmo após esta alteração, as mulheres não continuarão a ir a tribunal se abortarem às 10 semanas e um dia? Qual é a diferença entre abortar às 10 semanas e abortar às 10 semanas e um dia? Se o aborto passar a ser livre o número de abortos diminuirá ou aumentará? Alguém acredita que o objectivo dos proprietários de clínicas que se dedicam exclusivamente ao aborto é que estes diminuam? Basta olhar para o exemplo de Espanha onde o número de abortos não pára de aumentar!
4. Como se gasta melhor o nosso dinheiro? A cuidar ou a abortar? O que é melhor para o país nestes tempos de baixa natalidade? Mais crianças ou menos crianças? O que será melhor?
Dr. Luis Marques
Psiquiatra