quarta-feira, outubro 29, 2025

O Cristianismo e a Imigração

                                                  

 “Nós somos feitos de encontros. Quem ergue muros contra o outro, levanta muros dentro de si.”

Eduardo Galeano

Ontem foi aprovada, no Parlamento português, uma lei que restringe o acolhimento de imigrantes no nosso país. A discussão política pode ter vários tons e argumentos, mas há uma questão essencial, que enquanto cristão, não posso ignorar: um cristão jamais pode ser contra o imigrante. É um ponto de consciência, de fé e de coerência espiritual.

A base desta afirmação não é ideológica. Não é partidária. Não é sociológica. É Evangélica.

No Evangelho de São Mateus, capítulo 25, versículos 35 a 40, Jesus afirma:

“Porque tive fome e destes-me de comer; tive sede e destes-me de beber; era estrangeiro e acolheste-me; estava nu e destes-me roupa; adoeci e visitaste-me; estive na prisão e foste ver-me.”

E conclui:

“Em verdade vos digo: todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequenos, a Mim o fizestes.”

O próprio Cristo identifica-se com o estrangeiro. Ele não fala de fronteiras, nem de ameaças, nem de “invasões”. Fala de pessoas. Pessoas que sofrem, que fogem de guerra, de fome, de perseguição. Pessoas que, tal como Ele, também foram refugiadas — porque o Jesus que adoramos, enquanto criança, teve de fugir para o Egito para sobreviver à violência de Herodes. O Filho de Deus foi ele próprio imigrante.

Ser cristão é reconhecer Cristo no rosto do outro. E o outro pode vir da Síria, do Brasil, do Bangladesh, da Ucrânia ou de qualquer lugar. A geografia nunca foi critério moral para Jesus Cristo.

A esta perspetiva evangélica junta-se o ensinamento contínuo do nosso querido, Papa Francisco, a voz mais clara e profética do nosso tempo no que toca à defesa dos migrantes. Francisco insistiu que os imigrantes não são invasores, nem ameaça, mas um dom que enriquece a sociedade. São uma oportunidade de encontro, de reconciliação com a nossa própria humanidade, de redescobrir a fraternidade universal.

O Papa denunciava as políticas que fecham portas, constroem muros e alimentam o medo. Ele dizia, de forma firme, que rejeitar, hostilizar ou deportar imigrantes é um pecado grave. E lembra à Igreja e ao mundo que as lacunas económicas ou administrativas não podem justificar a indiferença ou a crueldade. Os problemas resolvem-se com políticas responsáveis e humanas — nunca com exclusão.

A questão da imigração não é apenas política, económica ou administrativa. É, antes de tudo, humana. E como cristãos – e como cidadãos – somos chamados a construir pontes, não muros. Para que a imigração seja positiva para todos, é necessário que exista responsabilidade, legalidade e integração. O Estado deve garantir processos claros e justos, para que quem chega possa trabalhar, contribuir e viver com dignidade. Mas nós, enquanto sociedade, temos também uma missão: acolher sem medo, ajudar sem preconceito, aprender sem arrogância.

Da mesma forma, quem chega ao nosso país deve procurar conhecer a nossa cultura, a nossa língua, os nossos valores, e contribuir para o bem comum. Quando portugueses e imigrantes se olham como irmãos – não como ameaça, nem como peso, mas como parceiros de caminhada – todos ganhamos. Cresce a economia, cresce a diversidade cultural, cresce a riqueza humana.

Cláudio Anaia