“Nessa ocasião,
os discípulos vieram a Jesus e perguntaram: "Afinal, quem é o maior no
reino dos céus?".
Então Jesus
chamou uma criança pequena e a colocou no meio deles.
Em seguida, disse: "Eu lhes digo a verdade: a menos que
vocês se convertam e se tornem como crianças, jamais entrarão no reino dos
céus.
Quem se torna humilde como esta criança é o maior no reino dos
céus,
e quem recebe
uma criança como esta em meu nome recebe a mim."
Mateus
18:1-5
No passado fim-de-semana, tinha conseguido um espaço livre para arrumações em casa, limpeza aqui, uma caixa acolá e eis que aparece uma fotografia que tinha tirado numa viagem de avião quando regressava de Paris, há uns anos. E lembrei-me do que me aconteceu, tão especial! Recordo…
Estava cansado e queria regressar o mais rapidamente possível ao nosso país, quando vejo numa das alas do avião uma senhora com uma menina de olhos azuis a olhar para mim, “...mas que linda criança!”, pensei eu. Olhei para o bilhete, na busca rápida do lugar, pois pensava dormir durante aquele voo, quando, para meu espanto, o lugar era exactamente ao lado da mãe daquela criança com um sorriso muito genuíno e simpático. Enquanto arrumava a mala de mão, sou surpreendido com vozinha: “Olá, eu sou a Maria e tu?” Era exactamente a criança que me perseguia com o olhar desde que eu tinha entrado no avião. Olhei, sorri e disse “Boa noite” à mãe e respondi à menina “Eu sou o Cláudio”.
Tinha assim acabado a minha tentativa de ter algumas horas de sono, encontrando motivo para conversa.
“Olha Cláudio, tenho 7 anos, ando na segunda classe e vim ver o meu pai....”. A mãe retorquiu com um sorriso nos lábios e disse-me: “O meu marido é emigrante em França há já alguns anos e viemos passar alguns dias com ele.”
“Põe o cinto Cláudio. O avião vai levantar voo.” Disse-me a Maria com um ar encantador.
E assim foi, o voo já estava “acertado”, e a Maria voltou a comentar: “O meu pai gosta muito de mim, sabias?”... Acenei com a cabeça de forma positiva e de seguida despertou ainda mais a minha atenção quando disse: “O meu pai disse-me que Jesus gosta de todas as crianças...”, a partir daqui aquela criança conquistou-me totalmente. E continuou: “Sabes, eu costumo rezar. Tu rezas??”... Entretanto a mãe disse: “Maria, não incomodes o senhor”... E eu disse: “Não há problema”, e virei-me para a Maria e respondi à sua pergunta: “Maria, sim eu rezo... Acredito, como tu, que Jesus é muito nosso amigo e gosta muito de nós...”.
Convém dizer que todos os passageiros sentados por perto estavam boquiabertos e encantados a assistir à nossa conversa. E ela continuou: “Amanhã já tenho escola, e ainda bem porque já tenho muitas saudades da D. Emília, a minha professora.” Irrequieta, não parava. Aquela simpática criança era o centro das atenções naquele voo. Voltava-se para trás, ria e às vezes até saltava no banco, logo devidamente repreendida pela mãe.
Entretanto, era chegada a hora da refeição no voo. A hospedeira pôs os tabuleiros e a respectiva comida. A Maria, numa generosidade digna apenas das crianças, disse-me: “Queres o meu bolinho?”. Recusei e disse-lhe: “É para ti. Come, é bom!”. E ela respondeu: “Eu sei Cláudio, mas eu gosto de dar o que é bom aos outros”. No momento parei e reflecti, “Meu Deus, mas que resposta... que lição de vida!”. E lá continuou ela com a sua alegria e espontaneidade.
Conversámos, brincámos e até me mostrou a nova prenda que o pai lhe tinha oferecido. Tudo isto com uma subtileza, uma pureza que apenas as crianças têm.
E eu que queria descansar e dormir naquele voo, nem dei por ele passar. Já estava na hora de aterrar. “Olha o cinto amigo Cláudio...”, lá dizia a Maria.
Entretanto, mais uma vez, a Maria “volta à carga” olhando através da janela, onde a bonita paisagem de Lisboa já era totalmente visível, disse-me com um sorriso malandro: “... Isto tudo ainda há de ser nosso, Cláudio”. A mãe, mesmo ao lado, não resistiu e deu uma forte gargalhada. Com um olhar zangado, a Maria respondeu dizendo: “Eu sei que é difícil, mas deixa-me sonhar!” retorquiu com grande convicção.
Chegámos ao tapete rolante e aguardávamos as malas. As minhas chegaram primeiro, e, quando nos preparávamos para nos despedir, aquela criança saltou-me para o pescoço e deu-me um grande abraço e muitos beijos. Mais uma vez a mãe interveio dizendo: “Olhe, ela é sempre assim!!” E eu respondi: “Ainda bem...!!”
Caro amigo leitor, como já lhe disse, esta história verídica já aconteceu há muitos anos, mas lembro-me dela como se de hoje se tratasse. Não esqueci aquela linda criança. Ela tinha tudo de bom. Quando cheguei àquele avião senti hospitalidade, partilha, amizade, o acreditar nos sonhos e, por fim, a ternura.
Na “lufa-lufa” e nas correrias do aeroporto, acabei sem saber de onde aquela criança era e onde morava, mas... não é preciso. O seu exemplo é aquilo que todos deveríamos ser uns para os outros, e quanto à morada, pelo menos uma ela já tem, mora no lado esquerdo do meu peito.
Foi bom voar contigo Maria, e espero nunca aterrar.......
Cláudio Anaia