quarta-feira, junho 23, 2021

O circo pandémico

 


Não suporto as horas e horas de futebol misturadas com patrioteirismo bacoco, que em todo o momento e em todos os canais nos dão em directo o “traseiro” do autocarro da selecção, os excitantes momentos de treino, as enfadonhas conferências de imprensa que são o cúmulo de lugares comuns, as entrevistinhas de “acha que vamos ganhar”, etc.
Mas se o futebol passa, a pandemia custa a passar. E a falta de sentido público e ético de autoridades veio para ficar. Na sexta-feira passada, o Governo decretou que 3 milhões de portugueses não poderiam sair da Área Metropolitana de Lisboa. E não é que o primeiro-ministro, umas horas depois, foi para Munique ver um jogo de futebol! Assim violou sem vergonha o que se lhe deveria, ao menos eticamente, impor. Assim, deu mais um passo na erosão da mais importante autoridade: a do exemplo!
Hoje, nem queria acreditar: o presidente da AR incitou os portugueses a acorrer MASSIVAMENTE a Sevilha na próxima quarta-feira para ver o jogo de Portugal!!! Nem consigo comentar tal dislate, um verdadeiro despudor face ao agravamento do que por cá se passa!
Proibem-nos de juntar uma família em restaurantes ou em outros eventos, mas com o futebol é tudo à solta, seja em estádio, seja nas esplanadas, seja onde for.
Há pouco, ouvi o PR “aclarar” o que Ferro havia dito. Por outras palavras, a desculpá-lo. Mas que necessidade havia de, mais uma vez, o PR vir em socorro de tais personagens quando soltam a língua em golfadas de asneiras e de desconsideração pelas pessoas comuns?
Enfim, um circo pandémico, em que o futebol é o anestésico ilusionista, as televisões são os palhaços ricos, e certas autoridades são ou trapezistas, ou malabaristas ou contorcionistas.
Tudo variando, pandemicamente falando, entre a depressão de uns dias e a euforia de dias seguintes e vice-versa. Sem equilíbrio, sem sensatez, sem sobriedade. Mas com futebol. Tudo muito rasteiro, muito ordinário, sem sentido de Estado e probidade de serviço público.
E, no entanto, como gostam de se insurgir contra os F ( futebol, …) do antigo regime…
 
António Bagão Felix