quinta-feira, agosto 02, 2018

Flores e borboletas

«Belo era o mundo.

 Belos a lua e os astros, bela a ribeira e as suas margens, a floresta e a rocha, a cabra e o besouro, flores e borboletas. Belo e agradável era andar assim pelo mundo e sentir-se tão criança, tão desperta, tão aberta à imediatez das coisas, tão confiante.»

Serei sincero: nunca foi um leitor entusiasta de Herman Hesse (1877-1962), o escritor alemão constantemente lido sobretudo por um público jovem. Todavia, do seu romance mais conhecido, “Siddharta” (1922), influenciado pelo pensamento budista, quis aqui extrair aquelas linhas, destinando-as a um tempo com sabor a férias. Sem cair em visões irracionais ou panteístas, é indubitável que temos necessidade – sobretudo nós, ocidentais – de reencontrar a harmonia com aquela natureza que muitas vezes ignoramos ou, pior, desfiguramos.

Conseguir finalmente lavar os olhos das casas cinzentas das cidades, das páginas repletas de números que se amontoam nas mesas dos escritórios, das máquinas que fremem nas fábricas, dos automóveis que envenenam e nos tornam neurasténicos: é este o antídoto necessário que devemos tomar nos dias estivais. Olhar a lua e as estrelas, a torrente e o bosque, as rochas e os animais, as flores e as paisagens.

Reencontrar o espírito da criança que sabe seguir os arabescos desenhados no céu por uma borboleta, abrirmo-nos à «imediatez das coisas». Disso precisamos de tempos a tempos para purificar a alma, antes mesmo dos pulmões. Noutro romance, “O jogo das contas de vidro” (1943), Hesse escrevia: «Pertencer ao vento e à chuva, fixar uma flor ou a água corrente de um rio sem nada compreender mas tudo intuindo, transportados para o mundo, para o mistério e o sacramento».

P. (Card.) Gianfranco Ravasi
Imagem: romrodinka/Bigstock.com