
Ora, nesse tempo, aconteceu que um monge se apaixonou perdidamente poruma monja. Ryonen era bela, duma beleza radiosa, ao mesmo temporesplandecente e misteriosa. A pele, o porte da cabeça, o andar, tudo no seufísico encantador deslumbrava, mas ela acrescentava-lhe uma inteligênciapenetrante, um carácter decidido, e uma generosidade, uma atenção aosoutros, que a iluminavam com uma luz interior. Ryonen poderia terenlouquecido de amor os mais sábios dos homens, e dos monges talvez...Hashino amava-a com um amor louco, exacerbado.
Não comia, não dormia,distraía-se durante as cerimónias rituais, estava obcecado, só a via a ela,só vivia por ela, acelerava a sua perda. Uma noite, deu o grande passo,cometeu o crime supremo, introduziu-se na cela monacal, e suplicou-lhe que oamasse. Ryonen ficou então com o destino de Hashino nas mãos. Teria bastado quegritasse, que chamasse as irmãs, e o pior teria acontecido. Mas ela não sedebateu, não manifestou nenhum espanto. Disse apenas ao noviço, que ardia dedesejo: "Entregar-me-ei a ti, amanhã."
O dia seguinte era dia de grande festa. Na altura da iluminação doBuda, o imperador assistia às cerimónias. Foi aí no santuário do templo deTojaidji, que ela apareceu a Hashino completamente nua: "Toma-me, disse ela, agora!" Então Hashino sentiu o Satori, o Despertar. Como aqueles desenhos ondea forma e o fundo se transformam ao mudar ligeiramente de lugar, ele viu arealidade até aí escondida. Soube que o seu amor era superficial,fantasmagórico, os seus desejos loucos semelhantes aos reflexos mutantes dalua na água. O véu da ilusão tinha-se rompido. Acedeu à raiz do eu, àverdade, à paz.
(História Zen)
Esta história foi enviada por o budista Luis Fataca